Carnaval 2007
Enredo:
ÁGUIA, A GUARDIÃ DA CASA DOS DEUSES
Ficha Técnica
Presidente: Osni Nascimento
Vice-presidente: Carlos Monte
Diretor de Carnaval: José Leonídio
Diretor de Bateria: Nando (Gigante)
Intérpretes: Tiago Cavaco, Gabrielzinho do Irajá, Flavia Aparecida, Raphael Bart, Diego
1ª Casal de Mestre Sala e Porta Bandeira: Sérgio Apolinário e Caroline Apolinário
Mestre de Bateria: Fernando (Nando – Gigante)
Diretores Mirins de Bateria: Vitor, Robson, Felipe e Gugu
Ritmistas: 120
Rainha de Bateria: Rafaela
Madrinha de Bateria: Luana Garrido
Intérpretes: Tiago Cavaco, Gabrielzinho do Irajá, Flavia Aparecida, Raphael Bart e Diego
Cavaco: Fabrício
Coreógrafo da Comissão de Frente: Lais e Gustavo
Sinopse
Autores: José Leonidio Pereira e Regina Celi R. Pereira
Na entrada da baia de Guanabara, Cauê em sua piroga recepciona os Deuses do Olimpo que vieram para assistir os jogos pan-americanos que serão realizados em sua homenagem. A natureza se engalana com uma coroa de arcoíris, dando brilho e cor a chegada de tão nobres visitantes.
Golfinhos com sua alegria costumeira dançam em torno deles, recepcionando-os com sua dança de extrema beleza e leveza. Os Deuses sorriem com o espetáculo que lhes é apresentado.
Cauê é o grande anfitrião, e a medida que as pirogas vão cortando as águas da Guanabara, ele começa a contar a história da Casa dos Deuses Tupinambás, para os Deuses do Olimpo: – Há muitos e muitos anos aqui só existiam as florestas, os animais, e era onde morava um povo Guerreiro, os tupinambás. Aqui também viviam seus Deuses, Iara e Tupã.
A casa de Iara é aquela montanha de pedra em forma de seio, de onde sai o rio Carioca, que veio dar o nome aos que aqui vivem hoje, e que desaguava na baia de Guanabara, formando o seu rosto.
Eram ali que em noites de lua cheia as belas índias Tupinambás acompanhadas pelos seus guerreiros preferidos vinham ouvir Iara cantar, sonhar com o futuro, e amar na relva a luz da lua cheia, acalentados pela Rainha das Águas. A casa de Iara era envolta por uma densa floresta colorida e que de suas flores exalavam os mais agradáveis perfumes, e que se estendia até a casa de Tupã, em sua linguagem, Metaracanga, “o guerreiro Tupinambá com seu penacho” (hoje a Pedra da Gávea), que fica do outro lado, naquele penhasco maior, Um dia o poeta Gonçalves Dias, fez um poema em seu louvor o Gigante de Pedra, o qual Osório Duque Estrada se baseou para criar a letra do Hino Nacional: “Gigante pela própria natureza, és belo, és forte, impávido colosso”. Com o céu e o mar servindo de adorno, Tupã está ali, “Deitado eternamente em berço esplendido ao som do mar e a luz do céu profundo”. O farfalhar das ondas e canto do Sabiá, são suas músicas preferidas, e o Cruzeiro do Sul sua visão Predileta. Existem dias em que se cobre de nuvens, e é quando Tupã faz-nos ouvir sua voz rouca, e nos mostra sua arma mais poderosa, seus raios. Nestes momentos, todos se calam, rendendo-se a autoridade do pai.
Aos seus pés morava a figura dos espíritos do mal, Anhangá macho e fêmea (Itaanhangá) e Ipupiara saído das águas do mar (leão marinho), e que impediam que os índios falassem com Tupã devolvendo sua voz (eco).
Uma grande lagoa de águas prateadas separava Metaracanga, das Terras do Sem Mal, Itatinga (maciço da Pedra Branca) que tem na sua entrada cinco grandes rochedos, sendo o grande pássaro (Águia) o seu grande guardião e por sua característica de dupla interpretação de acordo com quem o observa, guarda também a figura do ancião, que representa a sabedoria.
A seu lado o grande Jacaré, origem dos Tupinambás segundo suas crenças, a Paciência (Jabuti) e a Perseverança (o Lagarto derrotando a Cobra). Aqui moram a Sabiuna com seu canto maravilhoso, o canto da terra e o Guaráxaim, olhos e ouvidos dos Tupinambás na noite.
Quando os portugueses aqui chegaram pela primeira vez em 1º de Janeiro de 1502, foi este cenário que encontraram, achando que estavam na embocadura de um grande rios daí batirarem-no Rio de Janeiro, região que se manteve preservado por mais ou menos 50 anos, enquanto o contato era dos tupinambás com os franceses. A consequência deste intercambio foi a vinda dos franceses para criarem a França Antártica pelo Almirante Villegaignon.
Os reis de Portugal avocando para si, em função do Tratado de Tordesilhas, serem os donos das terras que pertenciam aos Tupinambás começaram a demandar com os nativos apoiados pelos franceses, culminando com o conflito comandado por Estácio de Sá, que resultou na fundação de São Sebastianópolis (Hoje a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro). A partir deste momento com a destruição total das aldeias, Carioca e de Urussumirim, e a morte de seu grande líder Aimbire e de sua mulher Iguaçu, as outras aldeias, num movimento de defesa da Casa dos Deuses Tupinambás, se aquartelaram nos morros da periferia (hoje, Penha, Alemão, Juramento, Urubu e outros), até serem totalmente aniquilados, pelos portugueses comandados por Antonio Salema. As florestas foram destruídas, os tupinambás foram contaminados com varíola e cólera, junto com intensos bombardeios de canhões apoiados pelos índios Términos comandados por Araribóia, inimigos dos Tupinambás.
Os Senhores hão de me perguntar: – Como, com a destruição de todas as aldeias pode chegar até os dias de hoje os valores que faziam parte da cultura nativa, tais quais, o nome dos lugares, das plantas, dos acidentes geográficos suas lendas e mitos?
– Tudo isso parece ter ocorrido através da transmissão desses valores, oralmente pelos então considerados infames pelos portugueses: índios, negros, ciganos, judeus, mouros, entre outros. A participação dos escravos negros por serem a grande maioria da população aqui residente e pela identificação cultural de seus valores com a dos Tupinambás, deve ter colaborado para esta perpetuação. Falam os mais antigos, de encontro do último índio que restou, um neto de Aimbire, com um príncipe negro Nlá Eiye e sua guarda de honra oriundos da região de Keto, que ao fugirem de um engenho nas cercanias das terras do Sem Mal, foram orientados por pequenos pássaros africanos (biquinhos de lacre) a seguirem para a Casa dos Deuses, a Floresta da Tijuca. Do encontro de Nlá com um descendente de Aimbire, surgiu o compromisso de que os negros manteriam vivas as tradições Tupinambás e a defesa da Casa dos Deuses, Iara, Tupã e a Floresta da Tijuca.
Para comandar a Legião de tupinambás que moravam eternamente dentro dos sagrados Jequitibás foi convocada a entidade negra Iansã de Ballé, a rainha dos ventos e comandante do espírito dos mortos, que se apaixonou por Nlá e de seu amor nasce Ogum Onylê, que herda do pai o compromisso da preservação dos valores nativos.
Criado livre entre os habitantes da cidade do Rio de Janeiro, e testemunha da chegada de Dom João e sua família em fuga de Portugal escoltado pelos ingleses, ameaçada que estavam por Napoleão. De bom transito com todos, convive com D. Pedro a quem ensina os fundamentos da capoeira, que torna-se devoto do Guerreiro São Jorge de onde faz parte da irmandade.
Participou na praça da aclamação da festa de recepção a D. Pedro I pela independência. Arrepiou-se e chorou ao ver Francisco Manuel da Silva, o Chico músico, que deu no seu sítio em Jacarepaguá, aos pés da terra do sem Mal, ao ouvir o canto da terra da sabiuna, fez com que seus acordes se convertessem no Hino Nacional.
Foi um dos primeiros a se apresentar na defesa da cidade contra os mercenários irlandeses e alemãs em sua tentativa de tomarem para si a cidade, criando junto com o mestre Vidigal e milícia de capoeira que lhes impôs uma derrota fragosa, levando os irlandeses a serem deportados para os Estados Unidos. Lutou com todas as suas forças contra a escravidão e pela preservação da Floresta da Tijuca, a Casa dos Deuses Tupinambás, em face de sua descrição pelos Ingleses para o plantio do café. Foi testemunha da discriminação feita pelos ingleses ao Santo de origem africana São Benedito, abandonado no adro da igreja de Santo Antônio, por ser um santo nego.
Em sua luta pela preservação da Natureza, da Casa dos Deuses Tipanambás, conviveu com a corte e conseguiu como aliada na defesa da causa nativa a própria rainha dna. Teresa Cristina Maria de Bourbon. Esta começou a se preocupar com o destino da cidade, que caminhava para um grande deserto com a derrubada da floresta e a consequente seca de seus mananciais de água, e da epidemia de febre amarela que vitimava cada vez mais ingleses moradores nos cafezais da Tijuca.
Outro que também defendia a Casa dos Deuses era o guarda florestal Manoel Gomes Archer. O próprio Dom Pedro II, sensibilizado pela rainha, envolveu-se coma causa e desapropriou as terras pertencentes aos ingleses para de novo ali surgir a floresta da Tijuca, a Casa dos Deuses Tupinambás.
Seis escravos sexagenários: Constantino, Eleutério, Leopoldo, Manoel, Matheus e a escrava Maria ofereceram-se para continuarem escravos e replantarem a floresta. Com a águia servindo como o elo entre o passado e o presente, A terra do sem mal e a Casa dos Deuses, as sementes foram sendo colhidas ali onde vivem eternamente os Tupinambás, reconstituindo na sua origem o que o homem destruiu. Um dia o poeta Gonçalves Dias, fez um poema em seu louvor o gigante de pedra, o qual Osório Duque Estrada após a Proclamação da República, se baseou para criar a letra do Hino Nacional, 100 anos após de composta, “Gigante pela própria natureza, és belo, és forte, impávido colosso”. Com o céu e o mar servindo de adorno, Tupã também está ali, “Deitado eternamente em berço esplendido ao som do mar e a luz do céu profundo”. O farfalhar das ondas e canto do Sabiá, são suas músicas preferidas, e o Cruzeiro do Sul sua visão predileta.
Refez-se o equilíbrio, através do compromisso de se manter para sempre acesa a chama da cultura Tupinambá que hoje vive dentro de cada um de nós, servindo de exemplo para o mundo, sendo hoje reconhecida por todos e a solicitação a UNESCO para tornar a Casa dos Deuses Tupinambá, Patrimônio da Humanidade.
Ali os homens aprenderam a voar, a ver a beleza da floresta encontrando-se com o mar. Ali ressoaram o Rum, Rumpi e o Lê do quilombo junto com o Batakoto, e o Torodonto, som do coração dos negros e dos tupinambás. Este sentimento nativo veio morar dentro da Portela, o nosso ninho, e ensinando aos Filhos da Águia para que o perpetuem.
Neste momento, gostaria de lhes apresentar vossa grande guardiã, á Águia, que também é da Casa dos Deuses, recebendo-os, Zeus e Hera Deuses do Olimpo e seus convidados para participarem desta grande festa que na entrada da Terra do sem Mal, para que os guerreiros tupinambás que ali descansam em sua eternidade, possam assistir de dentro da grande nave dourada que os conduz, “a Mãe do Ouro”, os jogos Pan Americanos que se realizarão em vossa homenagem e aos Deuses ali presentes, protegidos sob as asas da Águia, sua eterna guardiã.
Texto: José Leonídio Pereira
Samba de Enredo
Águia, a guardiã da casa dos Deuses
Autor: Alexandre Velloso
Um sentimento nativo
Veio morar em nosso ninho
Filhos da Águia traz pra esse carnaval
Dos Tupinambás, o patrimônio cultural
Sob a proteção da águia
A sagrada Terra do Sem Mal
E a casa dos Deuses, Iara e Tupã
Sublime monumento natural
Iara, Rainha
O amor semeia (BIS)
Em acalanto
Nas noites de lua cheia
Depois do conflito
Que trouxe a destruição
Apenas um remanescente
Manteria acesa
A chama da preservação
E com o príncipe negro
Foi firmado o compromisso
De suas tradições ser defensor
E foi seguido pelo seu herdeiro
Que lutou pela floresta com ardor
E com a desapropriação
O divino santuário ressurgiu
Seis escravos replantaram
O que a mão do homem destruiu
Lá vem o Pan! Vou visitar
E consagrar povo guerreiro
Tem festa para os deuses (BIS)
No lindo cenário
Do meu Rio de Janeiro
Todas as informações sobre os Brasis, ou seja, os índios da cor da brasa das terras de além mar, descobertas pelos portugueses, sempre foram dadas sob a ótica dos descobridores ou da igreja, que detinha o direito sobre o dizimo (10%) de tudo que aqui fosse encontrado e ou explorado. Que viviam no Rio de janeiro, nas terras que circundavam a baia de Guanabara, que segundo os estudiosos, uma população aproximada de 100.000 Tapuias, distribuídos em cerca de 30 aldeias. Os relatos daquela época denigrem a imagem dos índios Tupinambás, caracterizando-os como um grupo frágil, sem nenhum conhecimento e que viviam de uma forma totalmente primitiva, os homens da selva¨. Não levava em consideração o fato de serem “Tapuias”, ou seja, os mais antigos nestas terras. O único objetivo dos colonizadores era a exploração das novas terras e das suas riquezas, e do homem pelo homem para lhes servir, para que retirasse da natureza tudo o que pudesse ser válido e rentável, derrubando as florestas para o plantio da cana de açúcar, não lhes importando as consequências dos seus atos. Navios com bandeiras diferentes das de Portugal, começaram a frequentar a baia de Guanabara e a se relacionar com seus habitantes, os Tupinambás. Para a viagem de volta destas caravelas ao velho continente, levando principalmente o “pau Brasil”, o “jacarandá”, os adornos usados pelos índios e animais silvestres exóticos na Europa, era necessário suprirem-se de água potável, e aqui se localizavam dois dos mais puros e cristalinos mananciais: o do rio Carioca no delta do mesmo rio, e o do Maracanã, que desembocava no saco de São Diogo (hoje Praça da Bandeira). Além desta, alimentos tais como peixes, mandioca, e outros eram embarcados para a sustentação dos marinheiros durantes o regresso. Ressalte-se também a que o vinho e o rum escasseavam, sendo substituídos pelo cauim produzido pelas mulheres Tupinambás, alcançando uma escala de produção contínua, para suprirem as necessidades cada vez maiores.
De toda esta interação surgiu o interesse por parte dos comerciantes, principalmente da Normandia e da Bretanha, de edificarem aqui uma base de negociações mais sólida e para alcançar este objetivo foi idealizado por eles uma apresentação sócio/ político/ cultural na cidade de Rouen, que ficou conhecida como “Uma festa brasiliense em Rouen” que acabou sensibilizando o rei Henrique II, de acordo com as expectativas dos seus organizadores, O sucesso da apresentação fez com que os Tupinambás se apresentassem em outras cidades Francesas com o mesmo impacto de Rouen. As observações da festa feitas pelo rei, somaram–se as do relato feito pelo cosmógrafo franciscano, André Thevet e do cartógrafo Guilherme lê Testu acerca da “Costa do Pau Brasil”, mostrando que já existia uma aliança dos navegadores franceses, com os índios Tupinambás que habitavam as terras contíguas a baía de Guanabara. A fusão destes acontecimentos resultou no sonho da França Antártica dos comerciantes da Normandia, que foi encampado por Henrique II, financiando a vinda de Nicholas Durand Villegaignon e Gaspar de Coligny com aquele objetivo. Vale ressaltar que os franciscanos franceses, ainda relatam uma outra viagem de Brasis a França, no século XVII. A presença dos Tupinambás em solo Francês, sua forma de vida aproximou-os dos grandes Filósofos Franceses, dentre eles Miguel de Montaigne, que numa oficina de trabalho intelectual com os nossos Brasis, da Guanabara, colheu
subsídios para escrever “Ensaios” que influenciou durante quase quatro séculos grandes filósofos como Grotius, Pufendorf, Locke, Lafitau, Montesquie, Voltaire, Diderot, culminando na teoria da Bondade Natural defendida por Jean-Jacques Rousseau, que absorvendo o jeito de ser dos nossos índios adotaram como lema: LIBERDADE; IGUALDADE; FRATERNIDADE, resultando todo este movimento na Revolução Francesa. Também não se pode deixar de registrar que por influência da cultura francesa a rua do Ouvidor foi por mais de um século, um Boulevard legitimo, com mais de 100 lojas com suas vitrines típicas. Todos estes fatos mostram que vem de longe, quase cinco séculos, a integração sócio / político /cultural do Brasil com a França, e que é reeditada no início deste novo Milênio, em suas múltiplas faces no ano do Brasil na França.
Meus pequenos, que bela noite vocês me ofereceram, o carnaval dos meus sonhos começou. Parecia retornar no tempo, encontrar Paulo, Natal e Candeia.
